pai
281 palavras emsinto seu cheiro
quando pouco espero
relutante, de uma morte
desavisada
“morreu?”
“morreu”
não tive espaço
para mergulhar
só assenti com a cabeça
tirando o tênis da fortuna
que lhe cabia, tanto
fomos no seu enterrado
tinha seu nome lá
olhei, chorei,
esqueci
mas saiba que, nada foi
esquecido como seu obituário
minha mãe encontrou, esperava
cagava, pois tinha dinheiro de sobra
para espantar os bichinhos
silenciosos, perturbadores
olhei para sua última forma
umas gramíneas, uns assaltos
à estrutura familiar
você cheirava a cigarros
(marlboro vermelho)
e à álcool
(skol, whisky em direção)
não há uma foto que nos pertença
mas apenas a memória
do dia de noite, da tempestade
em que deitei em sua perna
e senti que nada poderia me
sujar, quebrar, destruir
trovão faz barulho, pai
eu entendi, muito cedo
das formas que pude
que a seriedade não estava no cardápio
que
nem tudo
é tão sério
como parece
Quando fomos jogar boliche em Jundiaí, por alguma razão egoísta de minha mãe (a razão mulher, por assim dizer), paramos na vitrine de uma loja, Avistei a caixa de um iPod, que pouco sabia como manusear, mas sabia de suas virtudes: um i minúsculo, uma caixa que pouco mostrava, um preço que pouco cabia.
“É esse?”
“É esse, pai.”
Colocando o aparelho para carregar em casa, manuseava os botões para descobrir o que fazia o seletor do menu ir para cima e para baixo. Apertava um botão, nada acontecia. Outro botão, nada. No meio do caminho, de um botão para o outro, no rastejo do dedo, algo se moveu. Ali percebi que o movimento se dava de maneira circular. Efetivamente, consegui navegar pelos menus das músicas.
Consegui escutar músicas.